PGR pede autorização ao STF para investigar Milton Ribeiro
A Procuradoria-Geral da República pediu ao Supremo Tribunal Federal a abertura de uma investigação sobre uma suposta participação do ministro da Educação, Milton Ribeiro, de pastores, servidores e prefeitos em um esquema paralelo de liberação de dinheiro do ministério. Pelo mesmo motivo, o Tribunal de Contas da União aprovou uma fiscalização extraordinária no MEC.
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O prefeito Gilberto Braga, do PSDB, do município de Luís Domingues, no Maranhão, relatou ao jornal “O Estado de Paulo” a conversa que teria tido com o pastor Arilton Moura. Integrante da Convenção Nacional de Igrejas e Ministros de Assembleias de Deus no Brasil, Arilton é suspeito de atuar como intermediário entre o Ministério da Educação e prefeituras.
“Ele disse que tinha que ver a nossa demanda, R$ 10 milhões ou mais. Tinha que dar R$ 15 mil para ele só protocolar e, na hora que o dinheiro já tivesse empenhado, era para dar um tanto ‘X’. Para mim, como a minha região é área de mineração, ele pediu 1 quilo de ouro. Então, o negócio estava tão normal lá que ele não pediu segredo. Ele falou no meio de todo mundo, inclusive tinha outros prefeitos do Pará. Ele disse: ‘Olha, para esse daqui eu já mandei tantos milhões’. Os prefeitos ficavam todos calados, não diziam nem que sim nem que não. E assim mesmo eu permaneci, calado. Também não aceitei a proposta. Deixamos as demandas na mão dele e ele deu a conta para a gente. Os que transferissem os R$ 15 mil, ele ia protocolar”, revelou Gilberto Braga.
Segundo o prefeito, o encontro ocorreu em abril de 2021, em um restaurante em Brasília, depois de uma reunião no ministério com o ministro da Educação, Milton Ribeiro. Gilberto Braga afirmou ao jornal que não pagou propina a Arilton Moura e, por isso, não recebeu recursos do MEC.
Na semana passada, o Estadão publicou que os pastores Arilton Moura e Gilmar Santos comandam um gabinete paralelo no ministério, que decide quais municípios recebem verba.
Gilmar Santos é presidente da Convenção Nacional de Igrejas e Ministros de Assembleias de Deus no Brasil. Os dois pastores não têm cargo no MEC ou em qualquer órgão do governo federal. Mas, com frequência, despacham no gabinete do ministro Milton Ribeiro.
O ministro não aparece em público desde esta terça-feira (22), quando a “Folha de S.Paulo” revelou uma gravação de uma reunião dele com prefeitos. Na conversa, Milton Ribeiro disse que o governo prioriza prefeituras que peçam a liberação de verba por intermédio do pastor Gilmar Santos e que esse foi um pedido especial do presidente Jair Bolsonaro.
Nesta terça, o ministro da Educação cancelou uma viagem para São Paulo. Nesta quarta-feira (23), ao chegar ao ministério, não passou pela portaria onde estão os jornalistas. Nas agendas fechadas, ele recebeu alguns aliados, que entraram e saíram sem gravar entrevistas.
Depois de se encontrar com o ministro, o senador Wellington Fagundes, do PL, contou que Ribeiro teria conversado e ouvido do presidente Jair Bolsonaro que não havia motivo para tirá-lo do cargo. Segundo o senador, o ministro está tranquilo.
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No Congresso, a Frente Parlamentar Evangélica, que tem 123 deputados e senadores, se reuniu para avaliar a situação do ministro Milton Ribeiro, que é pastor. A entrevista coletiva do presidente da Frente, deputado Sóstenes Cavalcante, do PL, que seria pela manhã, foi adiada para o fim da tarde. Na hora do almoço, Sóstenes se encontrou com Milton Ribeiro.
O deputado disse que o ministro não foi uma indicação do grupo e que, por isso, não cabe a eles pedir a saída dele do cargo. Sóstenes enfatizou que os áudios são sérios e precisam ser esclarecidos.
“Ele deve esclarecer mais fatos e por que isso se deu, de que forma, por que causa. Logicamente, isto é, entendo que é função de parlamentares – que pastores podem ser recebidos, podem até fazer uma interlocução ou outra -, mas não com a rotina que foi feita. E aí, só o ministro Milton pode explicar por que isso aconteceu”, afirmou.
O presidente da Comissão de Educação do Senado, senador Marcelo Castro, do MDB, disse que conversou com Milton Ribeiro por telefone e que ficou acertado que o ministro vai comparecer ao Senado na próxima semana. Para Castro, se comprovada a autenticidade da gravação, Milton Ribeiro teria cometido tráfico de influência.
“Porque é que dois pastores que não são funcionários do Ministério da Educação estão intermediando recursos? Evidentemente que são coisas esdrúxulas, estapafúrdias, fora da administração pública, e evidentemente que isso precisa ser esclarecido com todo rigor. O que é que o ministro disse? Que os recursos do FNDE iriam, em primeiro lugar, para os municípios mais necessitados e, em segundo lugar, para todos os amigos, não foi assim? Isso é tráfico de influência explícito”, criticou.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, do PSD, também defendeu que o ministro dê mais explicações sobre o caso.
“Evidentemente, a fala do áudio não é uma fala feliz. Vamos aguardar os desdobramentos para entender qual vai ser a temperatura política em relação a isso, e sobretudo permitir ao ministro que possa fazer os esclarecimentos devidos em relação àquilo que disse e o significado do que disse. E se, em termos práticos, houve algum tipo de favorecimento do Ministério da Educação ou não”, ressaltou.
No fim da tarde, o Tribunal de Contas da União aprovou uma fiscalização extraordinária no Ministério da Educação e no repasse de recursos às prefeituras. Segundo o ministro Vital do Rêgo, autor da proposta, os fatos noticiados apontam para a existência de indícios de irregularidades, o que justifica a atuação no TCU.
Por volta das 19h, o procurador-geral da República, Augusto Aras, pediu ao Supremo Tribunal Federal que autorize a abertura de inquérito para investigar se pessoas sem vínculo com o MEC atuavam para a liberação de recursos. A procuradoria quer ouvir os envolvidos no caso e que o ministério e a Controladoria-Geral da União esclareçam o cronograma e os critérios para liberação das verbas.
No documento, Aras ressaltou que o ministro “em momento algum negou ou apontou falsidade no conteúdo da notícia veiculada pela imprensa, admitindo, inclusive, a realização de encontros com os pastores nela mencionados”.
Sobre a declaração de Milton Ribeiro, que disse nesta terça, em nota, que não há “nenhuma possibilidade de determinar a alocação de recursos para favorecer ou desfavorecer qualquer município ou estado”, Aras disse que “a posição por ele ocupada – na cúpula do órgão máximo da área de educação do país – proporciona-lhe direção política sobre o funcionamento do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação e o seu respectivo cronograma”.
O procurador afirma ainda que as denúncias apontam para “a existência de uma potencial contrapartida à prioridade concedida na liberação dessas verbas”.
Na noite desta quarta, o ministro Milton Ribeiro confirmou à TV Globo que recebeu os pastores a pedido do presidente Jair Bolsonaro. Milton Ribeiro admitiu ainda que ouviu relatos de pedido de propina por intermediários e que, em agosto do ano passado, acionou o ministro da Controladoria-Geral da União, Wagner Rosário, para que fosse investigada a denúncia anônima.
O JN procurou a CGU para saber se há alguma investigação em andamento, mas ainda não tivemos resposta.
fonte: Jornal Nacional