Senado aprova PEC que prevê estado de emergência para ampliar benefícios sociais
Senadores aprovaram em dois turnos – quase por unanimidade – a proposta do governo federal de ampliar benefícios sociais até o fim do ano. Gastos dessa natureza não podem ser criados, ou aumentados, a tão pouco tempo de uma eleição exatamente para evitar que os governantes abram os cofres públicos irresponsavelmente para conquistar votos. Mas, para contornar esse impedimento legal, o texto aprovado prevê decretar estado de emergência.
A proposta inicial era o governo federal compensar os estados que decidissem zerar o ICMS – imposto estadual – sobre combustíveis. A União repassaria quase R$ 30 bilhões, mas a conversa com os governadores não avançou e o Planalto abandonou essa estratégia.
Por isso, o senador Fernando Bezerra Coelho resgatou outra Proposta de Emenda à Constituição, que já está no Senado e amplia ações sociais. Essa PEC foi duramente criticada pela equipe econômica no começo do ano.
Se aprovado no Congresso, o pacote prevê a ampliação do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600 para 18 milhões de famílias já inscritas no programa, e a inclusão de 1,6 milhão famílias que estão na fila; pagamento de vale-combustível para caminhoneiros no valor de R$ 1 mil por mês – 900 mil motoristas autônomos devem ser contemplados; aumento do vale-gás de R$ 53 para o valor médio de um botijão, a cada dois meses; e, além disso, a União compensaria gastos dos estados com transporte público de idosos e que derem incentivos aos produtores de etanol. Essas despesas vão ficar de fora das regras de controle fiscal, como o teto de gastos.
As medidas chegam a três meses das eleições e para valer até o fim do ano. Isso gerou questionamentos sobre a legalidade dessas ações, porque a lei proíbe criação de benefícios no ano eleitoral.
Em uma tentativa de blindar o Planalto, o relator, com base na consultoria do Senado e em acordo com o governo, decidiu incluir no texto a decretação de estado de emergência, também com duração até 31 de dezembro. O estado de emergência permite que esses benefícios sejam ampliados em ano eleitoral e afasta as regras de controle fiscal.
Ou seja, o governo poderia criar gastos não previstos no orçamento sem apontar de onde vêm os recursos, seja cortando outra despesa, seja aumentando imposto.
Durante a votação, o relator fez ainda algumas mudanças: incluiu no texto mais um benefício, para taxistas. A medida aumenta os gastos em R$ 2 bilhões. Também serão destinados R$ 500 milhões para o programa Alimenta Brasil, que já atende famílias em todo o país.
O texto ainda previa que a Caixa iria receber R$ 1,3 bilhão para operacionalizar o pagamento do auxílio, mas, durante a discussão, o relator retirou o valor, que não ficou estabelecido na proposta.
Sobre o vale-caminhoneiro, o Ministério da Economia vai definir como será o pagamento. O texto diz que os benefícios terão de ser operacionalizados por instituições federais, como a Caixa. Tudo isso elevou o custo total do pacote para R$ 41,2 bilhões.
O relator da proposta, senador Fernando Bezerra Coelho, defendeu o estado de emergência.
“Todas as preocupações que foram colocadas pelos meus colegas, pelos líderes partidários, para que a gente pudesse usar o reconhecimento do estado de emergência, na obediência estrita dessa necessidade urgente que nós estamos enfrentando em função da desorganização econômica que se verifica no mundo inteiro, fruto dos transtornos causados pela pós-Covid, pela pós-pandemia, desorganizando todo o sistema de produção mundial, que está levando inflação para todos os países do mundo”, disse.
Os partidos de oposição rebateram.
“Eu queria lembrar que o governo, esse governo que aí está, o governo Bolsonaro, nunca teve interesse em política social. Aí, agora, a menos de 100 dias da eleição, ele apresenta essa PEC, uma maneira de burlar a lei eleitoral, certo?”, questionou a senadora Zenaide Maia (PROS/RN).
O pacote foi aprovado em primeiro turno, por 72 votos a favor e um contra, em segundo turno, por 67 votos a um. O senador José Serra, do PSBD, foi o único a votar contra.
Especialistas afirmam que o estado de emergência não pode ser criado para driblar a lei eleitoral.
“A lei eleitoral estipula uma série de restrições em ano de eleição, e diz que se houver estado de emergência, essas restrições são colocadas de lado para que a população possa ser atendida. Agora, não existe estado de emergência criado apenas para, eventualmente, driblar a restrição da lei eleitoral. E não me parece que as condições estejam dadas para se reconhecer estado de emergência”, ressaltou Luiz Fernando Pereira, coordenador-geral da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político.
A proposta ainda precisa ser aprovada duas vezes em votações na Câmara.
fonte: Jornal Nacional