Itapuã lidera as reclamações por poluição sonora nos primeiros 15 dias de 2018.

Passar uma tarde em Itapuã nem sempre é sinônimo de ouvir apenas o mar de Itapuã, quando chega a temporada de alta estação. O bairro é o líder em reclamações registradas na prefeitura este ano, no intervalo de 1º a 15 de janeiro, por causa da poluição sonora.

Os dados fornecidos pela Secretaria Municipal de Ordem Pública (Semop) apontam para 70 denúncias de populares incomodados com o barulho, somente nos primeiros 15 dias de 2018, no bairro outrora cantando em verso, prosa e poesia pelo poeta Vinícius de Moraes.

Logo em seguida, completam a lista das regiões com maior número de denúncias na Semop a Boca do Rio (60 reclamações), Brotas (57 registros), Cajazeiras (53 queixas), Fazenda Grande do Retiro (41 ocorrências) e o bairro de Paripe, no subúrbio, com 40 comunicações.

Quando os dados se estendem para toda a capital baiana, na primeira quinzena, as principais fontes emissoras de som foram os veículos particulares (707 registros), residências (430) e estabelecimentos comerciais, como bares, restaurantes e boates (249 queixas).

Por mais sossego

Verão, férias, praia, festas, ensaios, shows, carros com sistema de som do tipo “paredão” e caixas de som portáteis são uma combinação infernal para uma parte da população, a exemplo da professora aposentada Romilda Carvalho, 63 anos, que mora na região do Abaeté.

Instalada no local há 40 anos, a senhora diz amar a tranquilidade da área no entorno da lagoa, mas frisa que a paz dura somente nos dias de semana. “De sexta-feira em diante, ninguém tem mais sossego por causa desses sons de carro que inventaram, o tal paredão”, ela brada.

Não tão longe dali, a rua da Música, mais conhecida como rua K, também era ponto certo de quem queria levantar a mala do carro quase à beira da praia, até que a comunidade local se reuniu para plantar diversos tipo de vegetação no canteiro onde os veículos ficavam estacionados.

“A coisa só melhorou por que moradores e pescadores se reuniram para acabar com essa disputa de som. Era uma coisa infernal”, contou o pescador Nelson dos Santos, 78 anos, que trabalha no local. “Se a gente não tivesse tomado essa atitude, ninguém teria paz”, completou.

Flexibilidade

Enquanto há aqueles que preferem a calmaria, por outro lado, as variadas opções de som alto formam um cenário perfeito para quem quer aproveitar o período pré-carnavalesco para colocar o repertório em dia, como o mecânico Alfredo Bonfim, 29 anos.

Ele é dono de um carro com som do tipo “paredão”, no qual gastou cerca de R$ 10 mil, que é capaz de fazer tremer o corpo de quem passa perto do aparelho. “O som é um terço do valor do carro. As meninas não aguentam ver”, vangloriou-se, na oficina onde trabalha, na avenida Gal Costa.

Questionado se não se preocupa em incomodar o sossego alheio, o mecânico argumenta que costuma utilizar o sistema somente nos encontros de paredão, em locais afastados. “Tem gente que não tem consciência, mas eu, particularmente, só uso nos encontros da galera”, sustenta.

estudante Luana Sampaio, 23 anos, que se assume como uma “pagodeira nata”, diz que as pessoas deviam ser um pouco mais flexíveis quanto ao som alto nessa época do ano. “As férias duram apenas um mês. É época de festas na cidade. É preciso ter um pouco mais tolerância”, clama.


Riscos da exposição

A otorrinolaringologista Clarice Saba explica que a exposição prolongada ao som muito alto pode causar zumbidos, lesões que podem levar a algum grau de perda auditiva, além de provocar sintomas como irritabilidade no ouvinte.

“Quando alguém vai para uma festa com som muito alto pode sair com um zumbido, que pode desaparecer no dia seguinte”, informa. “Senão, o mais indicado é procurar ajuda médica, pois, se for caso de perda auditiva, quanto mais rápido o diagnóstico mais chances de tratar e reverter”, acrescenta.

Para evitar esses sintomas, Saba orienta que o correto é controlar a exposição com o uso de um protetor auricular ou, a cada meia hora de exposição em ambiente fechado, fazer um intervalo de cinco a dez minutos para descansar os ouvidos.

“Se afasta um pouco, vai ao banheiro, para que a audição não seja afetada. E nunca ficar ao lado da caixa de som”, alerta. “O mesmo vale para os trios elétricos. Se não tiver um protetor, ao passar do lado do veículo, procure tapar o ouvido com o dedo”, ensina.

A médica ressalta, ainda, no caso do uso de fones, o ouvinte nunca deve ultrapassar mais da metade do volume do aparelho. “O cuidado com a alimentação também é importante, pois, excesso de gorduras e açúcar pode afetar a audição e o labirinto”, finaliza.

POR CAUSA DA FISCALIZAÇÃO DURA, OCORRÊNCIAS REGISTRAM QUEDA

A subcoordenadora de Combate à Poluição Sonora da Semop, Márcia Cardim, avalia que as queixas no órgão costumam ser mais frequentes durante a alta estação, no período que compreende os meses de novembro a março, quando a cidade costuma estar mais movimentada.


“Nesse período, o índice de poluição sonora aumenta devido ao grande número de pessoas que estão de férias”, observa. “Além dos próprios soteropolitanos, a cidade também recebe uma quantidade significativa de turistas em busca de diversão”, completa.


Segundo a gestora, atualmente, a Semop conta com uma equipe formada por 43 pessoas para fazer a fiscalização nas ruas. “Além das operações que fazemos, a população pode denunciar pela central 156, que sempre atende”, responde, quando questionada sobre a dificuldade que a população alega ter para acionar alguma equipe de fiscalização.


Cardim informa que a Lei 5354/98 determina que devem ser respeitados os limites de 60 decibéis no intervalo das 22h às 7h, além de 70 decibéis, das 7h às 22h, mas frisa que a cultura de ouvir som alto faz com que a norma não seja cumprida por parte da população.


“Infelizmente, as pessoas não têm educação, não têm consciência para respeitar que nem todo mundo compartilha do mesmo gosto musical”, avalia. “É uma questão que tem a ver com a cultura coletiva”, prossegue a subcoordenadora.


Redução


Apesar de a prática continuar, o número de denúncias no órgão caiu de 56.870, em 2016, para 47.225 no ano seguinte. Já as notificações caíram de 78 para 67, os autos de infração passaram de 103 para 85 e as apreensões de equipamentos sofreram queda de 204 para 159.


“Desde que a fiscalização passou para a Semop, intensificamos as fiscalizações, inclusive, com acompanhamento da Polícia Militar e da Guarda Municipal que, no caso das denúncias contra os veículos, apreendem logo os equipamentos”, frisou.

Fonte: A Tarde